domingo, 15 de junho de 2008


“VEJA” ATÉ QUE PONTO CHEGA O PRECONCEITO RACIAL:

“A sociedade brasileira sempre se definiu como uma sociedade de mistura racial, mas sempre soube separar certos lugares sociais para negros e brancos.”

No dia 01.11.2006 este Jornal publicou um texto de nossa autoria com o título “A tendenciosa influência da mídia nos rumos da democracia”. Este texto chama a atenção para a postura de parcialidade e de preconceito da grande mídia, em especial da revista “Veja”.

Corroborando a posição da revista, um de seus colunistas Diogo Mainardi, de forma dissimulada e ignóbil promoveu na edição de nº 2057 da “Veja” ataques à Política de Cotas nas Universidades do Brasil.

Referindo-se a uma ação que tramita no STF contra a Política de Cotas e o PROUNE, escreveu este jornalista sob o título “O Quilombo do Mundo” o seguinte texto: “É uma chance para acabar de vez com o quilombolismo retardatário que se entrincheirou no matagal ideológico das universidades brasileiras”. E utilizando-se de uma interpretação literal e pejorativa o jornalista termina seu texto dizendo: “O Brasil se refugiou no passado. O Brasil é o quilombo do mundo. Quilombo, segundo o dicionário Aurélio, é estado de tipo africano formado, nos sertões brasileiros, por escravos fugidos”.

Por seu turno e seguindo a mesma linha do torpe “raciocínio” de seu colega, um outro articulsita Reinaldo Azevedo, no dia 07.01.2008 na “Veja On-line” escreveu: “Que diabo se passa com o Partido Democrata americano, que tem como favoritos uma mulher e um negro com sobrenome islâmico e nenhum homem branco para enfrentá-los?”

Diante destas inequívocas opiniões racistas, não resta dúvidas do comportamento preconceituoso deste periódico, o que nos leva a lamentar e rechaçar prontamente essa ação e aclarar para a sociedade e para mídia, que em nenhum momento os defensores das Ações Afirmativas, propuseram entre a escolha das cotas e qualidade do ensino. Nunca houve esta dicotomia. È uma falsidade criada por setores reacionários para amarrar o debate.

Todos sabemos que em vários Países do mundo, especialmente os desenvolvidos, as “Políticas Afirmativas” já são debatidas ha muito tempo é o caso por incrível que pareça, dos USA que desde a década de 60 iniciaram a implementação dessas políticas nas esferas do trabalho e da educação.

No Brasil, assim como ocorreu com a “abolição da escravatura” este tema ficou engavetado por um longo período, mas despertou agora com muita força. Alguns fatores importantes reabriram o debate. O primeiro foi à criação, pelo Governo Lula, da “Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial”; o segundo, a Política de Cotas e o PROUNE e há também o Projeto de Lei de autoria do Senador Paulo Paim – PT/RS – que dispõe sobre o Estatuto da Igualdade Racial.

Não há como negar que nos 500 anos de história do Brasil os negros ficaram atrelados aos grilhões do preconceito racial e da hipocrisia das elites quanto ao tema. Aliás, sobre esta atitude o incansável Senador Paulo Paim justificando seu Projeto de Lei sobre o Estatuto da Igualdade Racial escreveu este brilhante enunciado: “Podemos afirmar que durante toda a nossa vida recebemos as verdades de terceiros. A primeira verdade que recebemos é a da infância, quando sentimos, mas não questionamos. A segunda verdade é a da revelação que dói, que choca, é a percepção de que nos impuseram uma grande mentira. A terceira verdade é aquela que está acompanhada da dignidade humana, é a verdade da transformação. É por esta terceira verdade que aqui estamos, queremos transformar a realidade em que sempre viveram os que sofrem discriminação”.

Neste mesmo sentido Ismar C. de Souza, militante do Movimento Negro e articulista “free lancer” assinalou com muita propriedade: “Os interesses e idiossincrasias de nossa elite conservadora produziram convicções escravocratas que se tornaram estereótipos, ultrapassando os limites do simbólico e incidindo sobre os demais aspectos das relações sociais. Por isso, talvez ironicamente, a ascensão dos negros na escala social, por menor que seja, sempre deu lugar a manifestações veladas ou ostensivas de ressentimentos”.

Por sua vez o Professor Valter Roberto Silvério, Coordenador do Núcleo de Estudos Afro-brasileiros da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar), criticando àqueles que contestam a Política de Cotas preleciona: ...há um cinismo, por parte da classe média brasileira, que nega a existência de racismo e que não admite que a educação tem o poder de combater o racismo, por medo de perder seus privilégios. Esses grupos, que sempre tiveram privilégios, não percebem que essas políticas geram a possibilidade de construção e o aprofundamento da cidadania".

Realmente são precisos os argumentos do Professor Roberto quanto à intolerância de alguns com relação às cotas. Aliás, neste diapasão a jornalista, Miriam Leitão afirmou que a igualdade perante a lei sempre conviveu com tratamento diferente aos desiguais. Na área tributária temos a regressividade; o “Bolsa Família” é direcionado às camadas mais pobre da sociedade; temos cotas para as mulheres nos Partidos quando da escolha de candidatos aos cargos proporcionais e até no comércio internacional existe o princípio do tratamento diferenciado para os Países mais pobres.

Portanto, fica nítido que as cotas estão dentro destes mesmos parâmetros, não há motivos para resistências, ao contrário, tem-se que ter consciência de que tratar da mesma forma os desiguais é que acentua a desigualdade.

Assim, e passados 120 anos da abolição “formal” da escravatura, temos que reconhecer nossa imensurável dívida com os irmãos afro-descendentes, cabendo a nós e aos movimentos populares impulsionarmos o Governo para dar prosseguimento à abolição por meio da intensificação das Políticas Sociais e o aprofundamento das Ações Afirmativas, e comitantemente, denunciar publicamente, toda vez que estas e outras Políticas de discriminação positiva forem contestadas de forma preconceituosa como o fizeram estes “capachos” desta “elite monocromática”, acobertados pela capa de jornalistas.

Um comentário:

Saah Cristinaa disse...

"tem-se que ter consciência de que tratar da mesma forma os desiguais é que acentua a desigualdade".
Com certeza,se o preconceito existe e é camuflado,compactuar com ele,fingindo que todos são mesmo iguais perante a lei,só dá mais força pra que continue existindo.A única forma de combater é discutir abertamente,tratar cada um como o que realmente são a fim de que mentes se abram e o preconceito deixe de existir.